Não te amo mais.
Estarei mentindo se disser que
Ainda te quero como sempre quis.
Tenho certeza de que
Nada foi em vão.
Sei dentro de mim que
Você não significa nada.
Não poderia dizer nunca que
Alimento um grande amor.
Sinto cada vez mais que
Já te esqueci!
E jamais usarei a frase
EU TE AMO!
Sinto, mas tenho que dizer a verdade:
É tarde demais..
Amar é coisa complicada...Quantas vezes confundimos amor com paixão? E com tesão? Quantas vezes?
Vejo a paixão como um sentimento totalmente narcísico, pois que na verdade o que interessa mesmo é o que sentimos. Caetano definiu muito bem a paixão quando disse:
"Eu te amo, mas você não tem nada a ver com isso..."
Paixão é intensidade, turbilhão, movimento, mobilização e, muitas vezes, solidão.
Como em um videogame, a paixão é a fase I, preparatória, quando você ainda tem "muitas vidas" para arriscar no caminho. Todos os "seus poderes" estão intactos, mas os monstros ainda não foram vencidos e o objetivo principal não foi alcançado.
Na paixão, os olhos são cerrados, o sentimento torna-se introvertido, mas o coração pulsa do lado de fora do peito. Aqui o alvo, ao contrário do amor, não é externo, já que o que nos mobiliza e encanta é o que sentimos. Como é preciso criar intimidade com o jogo, aprender os "macetes", dominar o joystick, o foco está no próprio jogador e não no jogo. E é exatamente isso que nos permite continuar. Acho que se assim não fosse, jamais passaríamos para fase seguinte, o amor.
Hoje, recordando a infância de minha filha, volto ao seu período de férias quando jogávamos "Mario Bros.", um videogame de sucesso na época. Eu amava aqueles momentos, ficava tão agitada com as partidas, que adormecia pensando nas possíveis soluções para "mudar de fase". Tudo para salvar a Princesa. Minha filha se divertia com meus pulos nos momentos de maior tensão do jogo e ria da minha total falta de intimidade com os controles do game. Nunca conseguimos finalizar o jogo, embora tivéssemos chegado muito perto.
A paixão é assim. Seu coração bate rápido, você acha que vai perder sua "última vida" a qualquer momento, dorme pensando no objeto de tanta aflição e sonha com as soluções mais desejadas.A paixão também tem muitas fases e, mesmo que cause o maior frisson ultrapassá-las, você pode nunca chegar a finalizar a partida.
E quando a Princesa é salva e o videogame é "zerado", o que acontece?
Bem, aí é apenas o começo de um jogo muito maior...
Por que será que nunca ninguém se preocupou em contar o que acontece depois que "eles se casam e são felizes para sempre"?
Por que no amor, o outro tem tudo a ver com isso...
O amor é relação, precisa de dois jogadores para que aconteça a partida (já perceberam que não existe uma expressão semelhante a "se apaixonar" que seja referente ao ato de amar?).
Costumo dizer que, para amar verdadeiramente, precisamos nos apaixonar (no sentido de sermos cegos) pelos defeitos do outro. Tambem é fundamental que sejamos obstinados e disciplinados para que, a cada amanhecer, ao olhar para quem está ao nosso lado relembremos o que nos levou a amá-lo. É como se, ao acordar precisássemos aprender a sonhar com os olhos bem abertos...
Como é difícil exterminar o Monstro da Rotina...
Muitos jogadores desistem, outros prosseguem apenas por hábito. Alguns experimentam os videogames da moda, sem descartar aquele já conhecido, surrado...
Poucos seguem tentando, perseguindo o vilão antigo com a meta de salvar a Princesa do Amor Verdadeiro. Para estes a batalha é diária e quase sempre confusa.
A paixão, assim como o tesão, se enquadra muito mais na dualidade que estamos acostumados do que o amor. Quase nunca temos dúvidas quanto as nossas paixões _ ou nos apaixonamos ou não. A paixão é taquicárdica e por isso é impossível não percebê-la.
Já quando amamos, que confusão...
O amor é de outro mundo. Não pertence à dualidade sim/não, é muito mais complexo que isso. Quantas vezes já não ouvimos alguém dizer:
"Não sei se ainda amo Fulano."
O amor é arrítmico, não acontece em linha reta, daí as nossas freqüentes dúvidas quanto a sua intensidade. O texto de Clarice Lispector "Não Te Amo Mais" mostra isso muito bem. Quando o lemos da maneira convencional, de cima para baixo, só vemos a dor. Mas, saindo da dualidade e buscando além, lendo o texto de baixo para cima (experimente), que surpresa!
Só conseguiremos vencer esse videogame, quando tivermos a coragem de ir além das aparências, sem medo de gastar nossa "última vida" para encontrar o que move a nossa relação.
Boa partida!
“Porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as compreensões, eu amava. Não sabia que, somando as incompreensões, é que se ama verdadeiramente.” (Perdoando Deus, de Clarice Lispector)
ResponderExcluirAprendi, há bem pouco tempo, em uma de minhas somas de incompreensões com o “meu jardineiro” (risos), que a paixão nem sempre é a “fase I”...
Talvez alguns relacionamentos (por não fazerem-se “jogos/jogados”) simplesmente iniciem-se em outro tipo de afeto... até mesmo o amor.
Espero continuar aprendendo, re-formulando e (re)criando meu modo de amar. Certamente minha base de referência para o assunto foi muito bem construída, tendo em vista a sorte de possuir a doce presença “florida de maio” em todo o meu caminho... Obrigada!
ps: Mario Bros. III foi “zerado”... (risos!)
Te amo minha Flor!
ResponderExcluirBeijos